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sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

ENSINO DE GENÉTICA E EVOLUÇÃO NO LIVRO DIDÁTICO - Lyndon Johnson Batista de Souza*; Ricardo Henrique Duarte Barbosa*; Ms. Luiz Gonzaga Pires**

Famosa coleção didática utilizada no Brasil de 1985 até 2009
Resumo
          O livro didático é uma importante ferramenta no processo de aprendizagem, pois trata das temáticas relativas aos programas que deverão ser lecionados, servindo assim de orientação e estímulo para o nível de escolaridade a que se destina. O avanço da tecnologia tem amplificado o volume de informações e contribuído para uma melhor interpretação dos fenômenos já conhecidos, isso faz necessário uma constante atualização do livro-texto.
         Esse trabalho teve o objetivo de avaliar o progresso do conjunto de conhecimentos de Genética e Evolução que vem sendo apresentado aos estudantes do Ensino Médio no livro didático da professora Doutora Sônia Lopes e, ao mesmo tempo, verificar como as grandes descobertas relativas a tais tópicos têm ocupado espaço nesses livros desde a sua primeira edição em 1985, até a sua quinta e mais recente edição de 2006. Procurou-se nessa análise verificar o conteúdo de cada edição quanto aos seguintes aspectos: contextualidade, nível de atualização, evolução gráfica (tabelas, ilustrações, esquemas, mídia) e a presença de tópicos que propiciassem uma discussão dos aspectos éticos ligados aos avanços da Genética e Evolução.
          A análise dos resultados mostrou que ocorreu uma grande disparidade entre os conhecimentos adquiridos pela biologia desde 1970 e o avanço letárgico dessas informações nos livros de ensino médio. Esse estudo poderá auxiliar numa reestruturação do ensino de Genética e Evolução no sentido de torná-lo mais reflexivo através de uma abordagem sempre atualizada, dinâmica e interdisciplinar, contribuindo para o entendimento da realidade à sua volta, possibilitando aos jovens estudantes utilizar esses conhecimentos diante de situações do cotidiano.
Palavras-Chave:
Genética, Evolução, Ensino e educação, Biotecnologia, Livro-texto
Abstract
            The didactic book is an important tool in the process on learning, because it responsible to the thematic relative to the programs that must be selected, in the intension to guide and stimulate the level of schooling in which it is destined. The advance of technology has amplified the amount of information and contributed to a better interpretation of the phenomena already known, so it has been necessary a constant actualization of the text book.
            This work had the objective to evaluate the progress of the set of knowledge of Genetic and Evolution that has been presented to the students of high school in the didactic book of professor doctor Sônia Lopes and, at the same time, verify how the great discoveries related to such topics have occupied space in these books since its first edition in 1985, until its fifth and also more recent edition in 2006. In this analysis, it was verified the subjects of each edition in such aspects: contextualization, level of actualization, graphic evolution (table, illustrations, schemes, and media) and the presence of topics which propitiate a discussion of ethics aspects related to the advances of Genetic and Evolution.
            The analyze of the results showed that occurred a very big disparity among the acquired knowledge by biology since 1970 and the lethargic advance of these information in the books to high school. This study can contribute to a rebuild in the teaching of Genetic and Evolution on the way to get it more reflexive through an approach always actualized, dynamic and interdisciplinary, aiding  to the comprehension of the reality around it, making possible  to the young students utilize these knowledge in the current situations.    
Key-words: 
Genetic, Evolution, Teaching and learning, Biotechnology, Text book.


*Biólogos e concludentes do curso de pós-graduação lato sensu em Genética e Evolução com ênfase em docência superior pela Universidade Federal do Piauí (UFPI).
**Físico e pedagogo, mestre em educação e professor de didática e metodologia da pesquisa na Universidade Federal do Piauí (UFPI).
[.....] Mais do que fornecer informações, é fundamental que o ensino de Biologia se volte ao desenvolvimento de competências que permitam ao aluno lidar com as informações, compreendê-las, elaborá-las, refutá-las, quando for o caso, enfim compreender o mundo e nele agir com autonomia, fazendo uso dos conhecimentos adquiridos da Biologia e da tecnologia.

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (ENSINO MÉDIO)
Ciências da Natureza - p. 19, 1998
1. A importância do livro didático no ensino
          O livro didático é um importante instrumento de orientação para os professores, seja no planejamento das atividades escolares, ou na elaboração das aulas. Massabni e Arruda (2000) afirmam que muitos professores tomam o conhecimento científico neles contido como padrão do que devem ensinar a seus alunos. Tal afirmativa não deixa de ser verdade uma vez que o livro é na grande maioria das vezes a única ferramenta utilizada na preparação dos conteúdos. Por isso é de total relevância que o professor tenha uma qualificação e um amplo conhecimento da área em que leciona, pois só assim poderá ter uma visão crítica do conteúdo abordado no livro-texto adotado. Como muitos professores de ensino médio iniciam suas carreiras sem terem a graduação, não sabem o que devem ensinar aos alunos e o livro didático acaba sendo à base desse ensino.
          Com os adventos da tecnologia, o livro didático tem passado por profundas modificações. A necessidade da atualização das informações como, por exemplo, a introdução de novos dados aos conteúdos das obras, fez com que as editoras especializadas no setor desenvolvessem projetos gráficos arrojados, tornando o livro mais atraente. Em virtude disso, o livro-texto acaba também por se tornar um fator de motivação para professores e alunos.   
          Para Lajolo e Zilberman (1999), entretanto, apesar de ilustre, o livro didático é o primo pobre da literatura, texto para ler e botar fora, descartável porque anacrônico: ou ele fica superado dados os progressos da ciência a que se refere ou o estudante o abandona, por avançar em sua educação. Sua história é das mais esquecidas e minimizadas, talvez porque os livros didáticos não são conservados, suplantado seu "prazo de validade”. A cada nova edição, tenham ocorrido grandes reformulações ou não, o livro didático com uma “nova capa” desvaloriza a edição anterior. Isso o torna no primo rico das editoras, na medida em que se transforma em um bem de consumo, "um produto típico da indústria cultural, um produto destinado ao consumo que editores e autores têm interesse em comercializar, uma mercadoria entre outras que circula pelo mercado e produz lucro, muito lucro" (apud Bittencourt, op. cit., p. 77). 
2. Ensino de genética e evolução no livro didático
          O ensino de genética na escola básica brasileira tem se caracterizado pela ênfase aos fenômenos mendelianos simples e pela repetição de conceitos e exemplos clássicos da hereditariedade. É notória a fragilidade da abordagem de aspectos da genética humana, das aplicações do conhecimento sobre a estrutura e ação gênicas e das biotecnologias vegetais e animais. Vale ressaltar que nenhuma ciência evoluiu tanto nos últimos 50 anos quanto à genética nos seus vários setores. Paradoxalmente, no ensino médio, a genética não tem acompanhado esse avanço e os livros mostram-se, claramente, desconectados dos novos grandes temas da área. Há uma uniformidade marcante no ensino da genética que resiste tanto ao tipo de escola (pública ou privada), quanto à região do país onde é ensinada. Há uma repetição de conteúdos programáticos, de conceitos, problemas, refletidos nos diversos livros didáticos. Não somente nas várias edições da autora em questão, como em edições de autores diferentes, há uma quase inacreditável, coincidência dos conteúdos tanto na sua composição quanto na sua organização. A forma canônica de uma genética clássica é clonada e adotada pelos mais diversos autores tornando o ensino de genética algo previsível. O enfoque, os exemplos adotados, torna os discursos dos professores uma espécie de “cantochão” didático.
Em qualquer canto do país os jovens são apresentados aos seguintes temas, quase sempre, nessa ordem:
- Primeiras ideias sobre hereditariedade: Aqui são apresentadas teorias vitalistas e pré-formacionistas da hereditariedade;
- As ervilhas de Mendel: apesar da importância do método científico adotado pelo “pai da Genética”, essa abordagem é apresentada de forma demorada dentro dos livros contribuindo para consolidar uma visão mecanicista e puramente estatística da Genética.
- Cruzamentos e probabilidades: quase todos os tipos de cruzamentos apresentados são frutos de trabalhos publicados nas primeiras décadas do Séc. XX. Os ratos de Cuenot, as galinhas de Bateson, as moscas de Morgan e a macaca Rhesus de Landsteiner só para citar alguns exemplos da série de outros tantos que se repetem ano após ano.
          As informações referentes ao ensino de evolução praticamente não evoluíram. Tratada pelos livros didáticos como sendo mais um tópico no rol dos conteúdos da biologia, não se evidencia a evolução como eixo integrador que envolve todas as áreas da biodiversidade como se destina. Assim como no ensino de genética, a evolução tem sido abordada de maneira repetitiva dando ênfase as evidências evolutivas (homologias, analogias, fósseis, órgãos vestigiais...), as teorias evolutivas e aos mecanismos da especiação. Não que tais temas sejam irrelevantes, porém a forma como são abordados utilizando-se dos mesmos exemplos (pescoço das girafas, bico dos tentilhões, burro como um híbrido estéril resultante do cruzamento entre o jumento e a égua e tantos outros), revela a defasagem no material didático. Talvez estes problemas contribuam para o fato de determinados conhecimentos científicos não se apresentarem nas escolas como o esperado.
           “Nada tem sentido em biologia, exceto à luz da evolução” já dizia Dobzhansky. Utilizar os conhecimentos evolutivos para a classificação dos seres aplicando os princípios da escola cladística, aplicar noções de deriva continental e tectônica de placas para a compreensão da vicariância, realizar conexão entre os mecanismos da genética para a especiação de cada grande grupo de seres vivos, seriam apenas algumas indicações que poderiam remover as ideias errôneas que muitos professores e alunos possuem da ideia de evolução associada ao progresso e de adaptação ligada à ideia de melhoria. "A visão de evolução que predomina nas escolas é a de um processo lento, resultado do acúmulo progressivo de mudanças aleatórias vantajosas em seu material genético, que são selecionadas pelo processo da seleção natural. Outras visões, como a Teoria do Equilíbrio Pontuado, de Stephen Jay Gould, e as evidências do Neutralismo, praticamente não aparecem nos livros escolares" (Dorvillé 2005).
3.  Vinte e dois anos de ensino de genética e evolução          
          Tradicionalmente a genética era estudada na 2ª série do ensino médio, porém, nos últimos anos com a implantação de vestibulares seriados seu conteúdo passou a ser ministrado na 3ª série. A carga horária semanal varia de escola para escola nas redes públicas e privadas, e é bastante comum na 3ª série rever concomitantemente os assuntos das séries anteriores em função dos vestibulares. Além de genética e evolução, o professor que ministrar esta “frente” normalmente encerra os trabalhos com o assunto de ecologia, pois este é um tema global e unificador de todos os tópicos do programa do ensino médio. Então a sequência tradicional do ensino fica sendo: Genética - Evolução - Ecologia.
          A coleção didática da professora Sônia Lopes pesquisada nesse trabalho, trás um de seus compêndios com os temas de Genética, Evolução e Ecologia desde a 1ª edição até a mais recente, lançada e utilizada por muitas escolas no Brasil. Após o lançamento das edições, o livro foi utilizado em sala de aula nos seguintes anos:
·         1ª Edição (1985) – Livro verde: 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91 e 92.
·         2ª Edição (1992) – Bio 3: 93, 94, 95, 96 e 97.
·         3ª Edição (1997) – Bio 3: 98, 99, 00, 01 e 02.
·         4ª Edição (2002) – Bio 3: 03, 04, 05 e 06.
·         5ª Edição (2006) – Bio 3: 2007.

Livro verde BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 1ª ed. Ática, 1985.
1ª edição - 1985
O conteúdo de Genética apresentado está relacionado direta ou indiretamente com a Genética Mendeliana. Somente no final do programa apresentado é que a autora trás uma unidade (3º unidade) revelando o modo de ação do material genético. Nesta, são apresentados os experimentos de Beadle e Tatum (Gene/Enzima), o código genético e o mecanismo de expressão gênica. Tal apresentação foi bastante salutar, uma vez que proporciona ao aluno uma melhor compreensão do conceito de gene.
          A grande falha observada por esta pesquisa foi a de não ter aparecido e nem se quer mencionado em nenhum momento, a tecnologia do DNA recombinante, pois até 1985, ano de publicação desta edição, a biotecnologia já era uma realidade social. Muitos outros fatos importantes relacionados à Genética, principalmente aqueles vinculados a natureza química do gene poderiam ter constado na obra. É bom lembrarmos que os Prêmios Nobel de Medicina e Fisiologia de 1978, 1980 e 1983 estão relacionados com a Genética molecular, e discutir os impactos que tais tecnologias poderiam trazer para a sociedade seria de grande relevância para os jovens estudantes.
          O conteúdo de Evolução é apresentado de forma clássica e histórica não atingindo os objetivos a que se destina. Nesta edição, não fica evidenciado a conexão entre os demais assuntos da biologia que é um dos principais objetivos do ensino de Evolução. Apesar dos trabalhos de Henning serem conhecidos desde 1966, a sistemática filogenética não é mencionada nem a importância da Evolução em tal mecanismo. Dentro dos conceitos de populações e espécies (parte II, capítulo 3), a autora revela noções da escola Lineana e afirma que até hoje esse sistema de classificação puramente tipológico é utilizado!
          A autora Sônia Lopes não contempla na 1ª edição nenhum aspecto relacionado à Evolução humana e não levanta qualquer questionamento de especiação por anagênese e cladogênese. No estudo das mutações (capítulo 4), poderia ter sido citado exemplos em cada um dos casos, facilitando assim a compreensão.
          A ausência total de propostas que possam transportar o aluno de um cenário meramente científico para um contexto em que estão envolvidos vários aspectos da Genética e da Evolução biológica, é notória do início ao fim desta primeira edição.
Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 2ª ed. Ática, 1992.
2ª edição - 1992
            Na apresentação desta 2ª edição a autora comenta:
“Após vários anos de seu lançamento, a coleção BIO foi agora totalmente reformulada. [...] O conteúdo foi atualizado de modo a contemplar o crescente desenvolvimento da área biológica, um dos campos do conhecimento que mais tem ampliado suas fronteiras atualmente”.
          No entanto, o que se observa no cerne da obra é que foram mantidos os mesmos tópicos, mesmos conceitos, mesmos exemplos e praticamente os mesmos problemas. O que houve na realidade foi uma supressão da edição anterior com a eliminação de muitos tópicos (noções de citologia, probabilidade de muitos eventos independentes, regulação da atividade gênica e noções de sistemática).
          Até o ano de lançamento desta edição (1992), a genética e a evolução juntamente com a biologia molecular, desfrutavam de um status impressionante. Os progressos no campo do sequenciamento de genes, da produção de proteínas humanas de valor terapêutico, da reprodução medicamente assistida, do melhoramento genético animal e vegetal e da transgenia foram fartamente propagados e já eram assuntos que começavam a fazer parte do repertório coletivo. Porém o que se observa é que o ensino de Genética e Evolução no livro-texto se demonstrava totalmente desconectado das grandes transformações que ocorriam no mundo que eram noticiadas diariamente nos meios de comunicação.
          Assim como a ausência da biotecnologia, na parte referente ao conteúdo de Evolução, continua não constando à evolução humana. Na pesquisa foi encontrado um erro, onde o favorecimento das pessoas heterozigóticas para o alelo da anemia falciforme em regiões onde a malária é endêmica, é citado como sendo um tipo de seleção disruptiva. A autora ainda comete um equívoco na página 21 – Leitura complementar: A difração de raios X e a estrutura da molécula de DNA – onde é afirmado que Rosalind Franklin compartilhou o Prêmio Nobel de 1962 com Watson e Crick. Na realidade o prêmio foi partilhado com Maurice Wilkins, pois Rosalind morrera em 16 de abril de 1958, vitimada de câncer de mama.
Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 3ª ed. Ática, 1997.
3ª edição - 1997
              Com esta 3ª edição, a coleção “BIO – 3” começa realmente a passar por significativas reformulações, havendo uma redução de tamanho e passando a ser totalmente colorido. Nesta, é introduzido no final da maioria dos capítulos um “tema para discussão”. Embora dos doze temas propostos, seis sejam uma mera repetição do item “Leitura complementar” da edição anterior, isso já revela uma considerável modificação, uma vez que os temas inéditos tratam de assuntos que circulavam constantemente nos meios de comunicação na época do lançamento (Projeto Genoma Humano, Mapeamento genético e Dilemas bioéticos). Também faz parte das inovações, o surgimento de um capítulo inteiro destinado à biotecnologia e a engenharia genética (capítulo 13 – anexo). Ora, a pauta dos principais noticiários é pontuada completamente por assuntos ligados a essas biotecnologias e assim, não seria concebível a continuidade da omissão dessas questões por parte da autora.
          A Evolução Humana aparece como um tópico dentro do capítulo de especiação. Sob a capa de que tal assunto gera muita discussão entre os biólogos, a autora limita-se apenas a sistemática, com uma abordagem dos Primatas, Hominídeos e do Homo sapiens, o que não deixa de ser um grande salto, pois tal assunto é totalmente ausente nas edições anteriores. O erro da edição anterior sobre a anemia falciforme foi devidamente corrigido e o equívoco do Nobel de 62 foi negligenciado! A essência do conteúdo de evolução foi mantida, porém noções de deriva continental foram pertinentemente mencionadas na página 236, ainda que de maneira bem simplificada.
          Infelizmente os exemplos de fenômenos hereditários (codominância, polialelia, interações gênicas, linkage, genética do sexo...) continuam sendo os mesmos das edições anteriores nos quais aparecem os mesmos organismos-modelo (ervilhas, moscas, coelhos e galinhas) das experiências conduzidas entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX. A utilização de exemplos envolvendo seres humanos ou plantas e animais de maior interesse é quase desprezível.
Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 4ª ed. Ática, 2002.
4ª edição -2002
            Alegando relacionar o conteúdo do dia-a-dia do aluno com a teoria exposta na obra, a professora Sônia Lopes apresenta esta 4ª edição com muitas inovações gráficas e teóricas. Muito bem diagramado e ricamente ilustrado, onde as fotografias da abertura de cada capítulo dão um requinte estimulante à leitura, fazem desta obra a mais didática das edições, sendo um “embrião” do grau máximo de perfeição gráfica que estará por vir no próximo lançamento.  
          Ao final de cada capítulo, foi introduzido um roteiro de estudo, um tema para discussão, testes e questões discursivas. No final da obra constam como anexo, uma tabela de atualização de nomenclatura, um índice remissivo, uma bibliografia mais ampla e o significado das siglas de instituições responsáveis pelos vestibulares de onde foram retiradas as questões para os exercícios.
          No cerne da obra vale ressaltar que foram feitas atualizações em função da revelação do genoma humano, como por exemplo, o número estimado de genes, que na edição anterior fala-se em 100 mil genes e agora em cerca de 40 mil. DNA codificante, não codificante, íntrons, éxons, DNA-lixo, eletroforese, proteoma e PCR são mencionados também. A clonagem e as vacinas gênicas ganharam tópicos individuais dentro do capítulo de Biotecnologia, que por sinal é o grande destaque inovador quando comparado com os demais capítulos.
          A possível explicação para uma mudança tão considerável nessa última edição baseia-se na escalada e difusão das descobertas dos últimos anos no tocante a clonagem de mamíferos, final do sequenciamento do genoma humano, comercialização de transgênicos, manipulação de embriões e de células-tronco, a popularização dos testes de DNA e todo um leque de estudos gênicos que prometem revolucionar a medicina, a zootecnia e a agricultura.
          Apesar da estrutura sequencial sobre o conteúdo de Evolução ter sido mantida, os transposons, retrotransposons e a seleção sexual ganharam espaço. No capítulo de especiação a autora finalmente introduz conceitos que são indispensáveis na compreensão do mecanismo evolutivo: gradualismo x equilíbrio pontuado; anagênese x cladogênese. A evolução humana ganhou mais espaço e uma ênfase maior, com informações sobre as possíveis rotas migratórias promovidas pelo Homo sapiens e a evolução da cultura.
         Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 5ª ed. Ática, 2006.
5ª edição -2006
         Mediante as transformações ocorridas na edição anterior, estimava-se que neste lançamento de 2006 a continuidade da evolução do projeto gráfico fosse acompanhada de atualizações teóricas significativas, mais não! Comparando essas duas últimas edições percebe-se que as alterações foram bem marcantes no aspecto gráfico – tipo de papel, dimensões, fotografias, tabelas, visualização – e bastante insignificantes no contexto teórico. As inovações ficaram por conta do acompanhamento de um CD-ROM com diversas atividades, da introdução da seção “Aplique o que aprendeu” nos exercícios, dos textos de abertura de cada unidade (Por que estudar...?) e de pequenas modificações ao longo do texto principal.
          Os quatro anos que separam os lançamentos dessas duas obras foram marcados por intensos debates Bioéticos. A lei de biossegurança e a manipulação de organismos geneticamente modificados, bem como a utilização das células-tronco embrionárias, pairaram na mídia quase que diariamente. Mesmo levando em consideração que a essência da obra deve ser mantida, não parece ser justificável a inércia do ensino de genética, a não atualização, a não contextualização do seu programa e não inclusão de uma abordagem das questões éticas, legais e sociais que afloram dessas novas pesquisas. Também seria salutar lembrarmos a total falta de informação sobre a genética do desenvolvimento e o processo de morte celular programada, que também foram bem alardeados nos meios de divulgação científica durante este período.
          Na parte destinada ao ensino de Evolução as mudanças praticamente não ocorreram. Nada de novo ao texto foi acrescentado – será que não tivemos evolução? – no entanto as modificações no texto ocorreram em termos organizacionais, ou seja, a genética de populações foi extraída do capítulo da teoria sintética e acrescentada ao estudo da especiação. Sobre a evolução humana tudo foi mantido como na edição anterior.
          O livro didático é o primeiro e provavelmente o mais acessível veículo de mudança. O conteúdo de um livro didático deve ser elaborado no sentido de provocar professores e alunos para o debate das novas questões que a biologia apresenta. Para isso o boxe “Tema para discussão” deveria ser mais criterioso, estando voltado com temas sincronizados com o capítulo que o precede.
4. Considerações finais
          O resultado da análise das cinco edições da coleção BIO 3 da professora Sônia Lopes, leva à constatação de que os livros didáticos de Genética e Evolução não incorporaram as novidades e revoluções geradas por essas ciências no lançamento de cada edição. As inovações tipográficas foram muito mais ordenadas que as informações teóricas, pois estas, na grande maioria da obra, são repetitivas e chegam a ser previsíveis. Se não fossem pelas mudanças nos exercícios e testes de vestibulares, um aluno portando a 3ª edição acompanharia normalmente sua série escolar ao lado daqueles que utilizassem a 5ª edição.
          Os professores já demonstram inquietação diante da demanda dos estudantes pelas descobertas da Genética e da Evolução. Se os vestibulares são elaborados com base na literatura do aluno, cabe aos autores e editores conciliarem as inovações com a realidade dos estudantes. Temas como ciência, poder e injustiça, vulnerabilidade de populações pobres diante das pesquisas genéticas, acesso a serviços de saúde, direito à informação genética, direitos reprodutivos, desenvolvimento ecologicamente sustentável, bem como o resgate de conceitos da ética e da moral são plenamente cabíveis no universo da escola básica, desde que haja uma adequação na forma de apresentar esses assuntos.
          Que a última edição, com sua excelente diagramação e perfeita sintonia didática, sirva de molde para absorver as inovações que ainda foram omitidas ou as que ainda estão por vir. O próximo passo, depois dessa renovação do livro didático, mantendo-se agora sim sempre atualizado, seria a reformulação do currículo de Genética e Evolução. O intuito seria de combinar essas novidades técnicas do livro-texto com enfoque bioético, tendo como objetivo geral dessa combinação, o desenvolvimento da percepção pública crítica das novas biotecnologias no contexto de um país com o panorama socioeconômico e cultural como o nosso.
          Por sermos professores de ensino médio e utilizarmos essa prestigiada coleção desde seu primeiro lançamento, sentimos a obrigação de realizar essa pesquisa com a intenção de despertar a necessidade da conexão entre os avanços da Genética e Evolução e o ensino, por meio do livro didático. Isso seria uma forma de não manter em atraso os nossos jovens em relação aos estudantes dos países ricos que têm acesso em grande proporção aos novos conceitos da genômica e das biotecnologias do DNA.


REFERÊNCIAS
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Resumo Expandido apresentado à Universidade Federal do Piauí – UFPI, pelos professores Lyndon Johnson & Ricardo Duarte, como requisito para obtenção do grau de Especialista no Ensino de Genética e Evolução com ênfase em Docência Superior em 2007.